Texto: Gustavo do Carmo
Fotos: Gustavo do Carmo e Divulgação


Foto: Gustavo do Carmo
O veículo mais antigo fabricado no Brasil está completando 55 anos. Na Alemanha, a Kombi nasceu em outubro de 1949, sugerida dois anos antes por Ben Pon, um empresário holandês, dono de concessionária e que se tornou o primeiro representante da Volkswagen em seu país natal. Pon rabiscou em seu caderno de anotações o esboço de um automóvel revolucionário que pudesse transportar cargas de forma eficaz.




Construído sobre um novo monobloco, mas compartilhando suspensão e motor do Fusca (conhecido na época como Sedan ou Tipo 1), o utilitário deveria suportar cerca de 800 kg com um motor de cilindros contrapostos (boxer) de apenas 1.2 litro de cilindrada e 25 cavalos. Para distribuir o peso, Pon recomendou que a carga seja transportada no meio, o motor atrás e os dois passageiros fossem na frente. O primeiro furgão monovolume do mundo nasceu com dois nomes oficiais: Typ (tipo) 2, referente ao projeto e Transporter, o nome comercial. O nome Kombi usado por nós é a abreviação de kombinationsfahrzeug, ou seja, combinação de espaço para o transporte de passageiros e carga. Resumindo, veículo multiuso, antecipando o conceito do Doblò, do Kangoo e do Berlingo, que estão em baixa atualmente por aqui. 
Protótipo Plattenwagen

Em 1950 já era vendida no Brasil como Kombi, importada pela Brasmotor, a mesma que traria o Fusca, também representante da Chrysler e antiga dona dos eletrodomésticos Brastemp. Logo passou a ser montada na sede da empresa, em São Paulo. 

Sua carroceria parecia um pão de fôrma inteiro. Os pára-brisas eram divididos, a frente fechada por causa do motor traseiro (a entrada do ar que o refrigerava ficava na lateral), e ela tinha um par de faróis redondos. A sua personalidade era dada pelo vinco em V e o grande emblema VW. 

Há cinquenta e cinco anos a Kombi inaugurou a fábrica de São Bernardo do Campo, no ABC paulista. A Kombi começou a ser produzida antes mesmo do Fusca, que já era importado, mas só seria produzido dois anos depois. Como o sedan, a Kombi começou com 50% de nacionalização. 


O primeiro utilitário fabricado no Brasil também tinha o seu defeito: o motor 1200 refrigerado a ar era barulhento. Mas a sua capacidade de transportar até 9 passageiros, os seus 4,8 m3 de espaço útil e a facilidade de manobrar fizeram da Kombi um sucesso. A capacidade menor das concorrentes Willys Rural e Toyota Bandeirante também colaborou para que a van da Volkswagen dominasse o mercado. 

Em 1961, 95% dos componentes já eram feitos aqui. Disponível inicialmente nas versões furgão (fechado) e passageiros (com oito janelas laterais, quatro de cada lado, sem contar as da coluna traseira e as dos passageiros da frente), ganhou em 1967 a picape. Também teve uma versão de seis portas laterais. A partir daquele ano, a Kombi brasileira começou a parar no tempo, embora tivesse recebido um novo motor 1500 com 44 cavalos de potência. 

Na Europa, a Kombi evoluía para uma versão que levaria trinta anos para chegar aqui: teto alto, janelas laterais maiores e porta corrediça. Era chamada de Clipper. Depois foi mudando de carroceria até se transformar na Caravalle vendida aqui como importada em 1999.

Caravelle 2012
A primeira das duas únicas mudanças radicais da Kombi brasileira só aconteceu em 1975 e, ainda assim, pela metade. O vinco em V desapareceu, o pára-brisa passou a ser inteiriço e alinhou-se ao teto. As redondinhas luzes de direção deixaram a companhia dos faróis e foram parar próximas ao pára-brisa, retangulares, com lente laranja e integrados a uma entrada de ar. Os para-choques perderam os apliques verticais e ficaram mais retos. As janelas do motorista e do carona deixaram de ser corrediças para terem abertura convencional, por manivela. Atrás, as lanternas deixaram de ser ovais e aumentaram de tamanho. Por dentro, um novo painel que durou até 2005. Com a reestilização, a cilindrada do motor se tornou 1600 e a sua potência subiu para 52 cavalos. 

Foto: Raphael Ruivo (Wikipédia)

Pronto. A partir daí a Kombi foi ganhando apenas alterações nas calotas, na moldura dos faróis e no acabamento interno. Chegou a oferecer picape de cabine dupla e estendida e até motor a diesel (1600, com 50 cavalos), em 1984, identificado por um indiscreto radiador na frente. Transformou-se em motor-home, ambulância e conquistou de vez os feirantes. Já havia sido camburão de polícia, mas foi trocada pela Chevrolet Veraneio.
Kombi Diesel

Com a reabertura das importações no início dos anos noventa, desembarcaram as coreanas Towner, Topic e Besta e a japonesa L300, da Mitsubishi. Conquistaram compradores, mas não tomaram o lugar da Kombi. A primeira era muito pequena e as três últimas muito grandes. O mesmo valeu para Ducato, Partner, Boxer, Sprinter, Trafic e Master. 

Por isso, a Volkswagen deu apenas uma refrescada na Kombi, sem renovar totalmente o utilitário, mas, finalmente, trazendo as janelas maiores, a porta corrediça e o teto elevado. Voltou a criar uma versão luxuosa que não existia desde os anos 70, batizando-a de Carat.

Em 1998, o motor boxer 1600 ganhou injeção eletrônica. Em 2004, virou bicombustível. E dois anos depois, por causa do aumento da rigidez das leis antipoluentes nacionais, o motor a ar, usado no primeiro Fusca alemão, há setenta anos, e há mais de cinqüenta no Brasil foi finalmente aposentado. Em seu lugar entrou o 1.4 Total Flex, com refrigeração a água, bicombustível (potência variando entre 78 e 80 cavalos), mas ainda montado na traseira. Visualmente, o carro voltou a usar a grade acoplada do antigo modelo a diesel e, por dentro, um novo quadro de instrumentos, transplantado do Fox e do Gol. Mas criaram uma série especial, a Prata, como despedida para o motor a ar. Em 2007 foi vendida  outra série, desta vez limitada a 50 unidades, em comemoração ao cinquentenário da peua, com pintura saia e blusa: vermelha na carroceria e branca no teto.



Com a saída de cena das vans coreanas e o preço elevado das atuais rivais, a Kombi ganhou sustentação graças aos donos de lotação. Mesmo arcaica, a Kombi brasileira já foi exportada para a Argentina, México e Nigéria. Atualmente, costuma ser comprada por empresas de personalização no exterior que buscam atender aos fãs saudosos da antiga Microbus. 

Já se falou que a Kombi ganharia uma nova geração baseada na plataforma do recém-reestilizado Gol. Mas não passou de especulação. O conceito Bulli, apresentado no Salão de Genebra de 2011, que criava uma versão modernizada, como fizeram com o Fusca (New Beetle), ainda não conheceu a versão definitiva e muito menos deve chegar ao Brasil.


 

Em 2009 o governo federal deu cinco anos de prazo para que todos os carros fabricados no país estejam equipados com airbags frontais e freios ABS. Será o fim da Kombi em 2014? Nada disso. A Volkswagen já trabalha para adaptar os modernos itens de segurança neste projeto de 55 anos. Neste período, foram produzidas mais de 1,53 milhões de unidades e em 2012, até julho, houve aumento de 4% em suas vendas, mesmo com a volta das vans asiáticas, agora chinesas. Enquanto a fabricação dessa carroceria permanecer viável, a Kombi ainda fará a alegria de feirantes, fretistas e do transporte alternativo por muitos anos. E falo isso de novo.


FICHA TÉCNICA - VOLKSWAGEN KOMBI 2012

Motor: Quatro cilindros, traseiro, longitudinal, álcool e gasolina, 1.390 cm³, 8 válvulas
Potência: 78 cv (gasolina) e 80 cv (álcool)
Aceleração de 0 a 100 km/h: 16,6 segundos (gasolina) e 16,1 seg. (álcool)
Velocidade máxima: 130 km/h
Consumo Médio: 11 km/l (gasolina) e 7,8 km/l (álcool)
Comprimento/largura/altura/entre-eixos: 4,50/1,72/2,04/2,40 m
Porta-malas: 804 litros
Tanque: 45 litros
Preço: R$ 43.834 (furgão) e R$ 47.434 (passageiros Standard)