A moda de dar um visual aventureiro a um veículo de passeio começou em 1994 com a Subaru Outback, uma versão do gênero da segunda geração da Legacy Wagon. Ambas vieram importadas para o Brasil. Nos modelos nacionais, o modismo começou em 1999, com a Fiat Palio Weekend Adventure e logo se espalhou para outros modelos da marca italiana, como a picape Strada, o furgão Doblò e a minivan Idea. Nos hatches compactos, o sucesso das versões aparentemente preparadas para a lama teve início com o Crossfox, que ganhou até música (Eu sou Stephany no meu Crossfox). Desde então, já tivemos Chevrolet Celta Off-Road (na verdade, apenas um kit com quebra-mato, molduras pretas nas rodas e pneus de uso misto), Onix Activ, Ford Fiesta e Ka Trail, Volkswagen Gol Rallye, Citroën C3 XTR, Hyundai HB20X, entre outros.
Destes citados só sobrou o Hyundai HB20X, que ganhou segunda geração no ano passado e será agora comparado com dois modelos que não são exatamente um lançamento. O Ford Ka Freestyle foi lançado em 2018 com motor 1.5 e o Fiat Argo Trekking no ano seguinte, com motor 1.3 e câmbio manual, mas que no final do ano ganhou o motor 1.8 com câmbio automático de seis marchas, conjunto mecânico com o qual vai participar do comparativo. Só para informar: também em 2019, o Ka Freestyle ganhou a opção do 1.0, mas vou considerar o 1.5. O HB20X, infelizmente, não ganhou o motor 1.0 turbo GDi das outras versões. Ele tem apenas o velho 1.6 16v que já foi usado no Veloster, que ganhou dois cavalos na potência (agora 130 cv) com álcool e mais um com gasolina (123 cv). Estes hatches compactos com estilo "aventureiro" são a alternativa para quem acha os SUVs compactos muito caros, principalmente o Jeep Renegade, cujo motor e câmbio foram adotados no Argo Trekking.
Tirando o quebra-mato, que não se usa mais por segurança, e o estepe na tampa do porta-malas, que só foi usado no Crossfox, os três hatches têm em comum a moldura preta no arco das rodas, a suspensão elevada e o bagageiro no teto. O Argo tem o preto nas máscaras dos faróis, em alguns detalhes no para-choque, em uma faixa no capô, próxima ao para-brisa, e no teto. O Ka tem grade colmeiada escura e o HB20X, como o Argo, tem máscara escura nos faróis, mas usa moldura cromada na mesma, que tem tramas diferenciadas das versões comuns. Os dois últimos têm proteção metalizada no para-choque dianteiro.
Em relação ao estilo geral da carroceria, o HB20X tem a aparência mais moderna, mesmo com a polêmica grade da marca e o estranho aplique plástico lateral no final da janela traseira. Na minha avaliação, prevaleceu também a idade dos modelos e o Hyundai é o mais novo (de 2019). O Argo, que eu tanto critiquei no único comparativo que fiz com ele em 2017 (ano de seu lançamento), vem em segundo. A opinião continua a mesma: ele tem grade estranha e é reto demais. Mas ainda é mais moderno que o Ford Ka, o mais antigo dos três, que data de 2014, com discreto face-lift em 2018 (lançada, aliás, pelo próprio Freestyle).
No acabamento, os três têm painel (com tela multimídia flutante) e portas com muito plástico duro e pouquíssima faixa de tecido. O Argo, com bancos personalizados que trazem o nome da versão, mas o couro é opcional, e o HB20X, com costura alaranjada, aparentam mais qualidade pela variedade de texturas do plástico. O Ka, com a parte superior do painel marrom, ficou em terceiro lugar.
Espaço interno e Porta-malas
A comparação de espaço interno foi baseada nas medidas da revista Carro e a maior distância para as pernas é do Argo, com 32 cm, que também tem a maior largura (1,48m) e altura (91 cm), seguido pelo Ka com 23 cm (1,45m de largura e 90 cm de altura). O HB20X tem apenas 19 cm (1,45m e 91 cm). No porta-malas, o Hyundai empata com o Fiat com 300 litros de capacidade. O Ka tem apenas 255 litros.
Motor e Câmbio
Os três "fora de estrada" usam câmbio automático de seis marchas, mas se diferem bastante na motorização flex. O maior e mais potente motor é o 1.8 do Argo Trekking, com 139 cv com álcool (e 135 cv com gasolina). O segundo com mais cavalos é o 1.5 do Ka Freestyle, que rende 136 cv (128 cv) e é o único de três cilindros. Mesmo com a cilindrada maior (1.6), o HB20X alcança no máximo 130 cv (123 cv com gasolina).
Desempenho e Consumo
Apesar da menor potência, o HB20X foi favorecido pelo menor peso (1.098 kg) e é o mais rápido, com aceleração de 0 a 100 km/h em 11,3 segundos, segundo a revista Quatro Rodas. Seis décimos depois chega o Ka Freestyle (11,9 seg. e 1.135 kg) e em terceiro vem o Argo Trekking (1.264 kg), com 12,4 segundos. O Hyundai também tem a melhor retomada entre 80 e 120 km/h, com oito segundos. Já o Ford e o Fiat empatam nos 8,9 segundos. Pela diferença na aceleração, decretei empate técnico entre os dois no segundo lugar em desempenho.
O HB20X, novamente beneficiando-se de ser mais leve e agora pela menor potência, também é o mais econômico, percorrendo 12,4 km/litro na cidade e 16,9 km/l na estrada com gasolina. Em segundo, vem novamente o Ka, com 11,6 e 15,2 km/l, respectivamente. E o Argo, mais uma vez, fica para trás, com 9,3 e 12,9 km/l, o que mostra que o motor 1.8 já passou da hora de ser substituído pelo 1.3 ou 1.0 turbo que está prometido há anos para os modelos do grupo Fiat-Chrysler (FCA).
Frenagem e Ruído
O hatch da Hyundai continua com o seu domínio nas provas dinâmicas. Na frenagem é o mais rápido a parar, tanto a 80 km/h, em 25,2 metros, quanto a 120 km/h, em impressionantes 59,5 metros. Em segundo vem o Ford, com 27 e 63,2 metros e depois aparece o Argo, com 27,6 e 64,7 metros.
Os já mencionados dados de desempenho, consumo e frenagem são da revista Quatro Rodas, mas o ruído foi avaliado pela Carro, que teve extinta a sua edição impressa. Deste, só o do Ka é realmente da versão Freestyle. Para os outros modelos tive que improvisar para não inviabilizar o comparativo. Do Argo, usei os dados da versão Precision 1.8 e do HB20X o motor 1.0 turbo, num dos últimos testes da publicação, que atualmente só está disponível na internet e não avalia mais completamente os carros, ainda mais depois da pandemia do vírus comunista chinês.
Feito o esclarecimento, vamos a classificação, que varia um pouco com a velocidade. A 80 km/h, Argo (60,1 decibéis) e HB20X (60,5 dBA) empatam tecnicamente, com ligeira vantagem para o Fiat. No desempate, a 120 km/h, o sul-coreano fabricado em Piracicaba mais uma vez foi superior, com 63,5 dBA. O italiano de Betim ficou com 67,5 dBA. Em terceiro, seja a 80 km/h (61,9 dB) ou 120 km/h (68,9 dB) aparece o Ka, refletindo o fraco acabamento repleto de plásticos.
Preço, Equipamentos e Assistência
Mais barato dos três, o Ford Ka Freestyle 1.5 é vendido em versão única (a não ser a opção 1.0) por R$ 68.490. Já o Fiat Argo Freestyle 1.8 tem opcionais. Sem eles custa R$ 69.990. Já quando são adicionados os kits Tech e Style, além da câmera de ré, o preço pula para R$ 77.840, 150 reais mais barato que o HB20X Diamond Plus, que sai por R$ 77.990. O Hyundai é o único que tem quatro versões, pois o HB20X é considerado um modelo à parte na linha da marca sul-coreana. São elas: Vision (R$ 67.890), Evolution (R$ 68.990), Diamond (R$ 73.990) e a Diamond Plus, levada em conta no comparativo.
O empate técnico entre Argo e HB20X deixa de existir se o comprador quiser outra cor que não seja a única oferecida sem custo. Sem pagar a mais, o Hyundai só tem uma opção, a Branco Atlas. Se o interessado no Argo quiser uma cor igual (chamada Branco Banchisa na Fiat) ou vermelho Monte Carlo, terá que pagar mais R$ 950, mesmo preço das pinturas extras do Hyundai. Mas se não quiser desembolsar mais pela pintura, só tem o preto (Vulcano) como escolha. O Argo ainda tem a opção da metálica Cinza Silverstone e da perolizada Branco Alaska, as duas pelo mesmo preço de R$ 1.800. O Ka Freestyle, a exemplo do modelo da Fiat, também só oferece de graça a pintura preta (Ebony) e cobra a mais pela pintura sólida branca (Ártico), só que pede menos (R$ 700). O Ford tem outras quatro opções de cores, duas metálicas e duas perolizadas, que custam R$ 1.500. Com a grande diferença de preço a seu favor, passa a custar R$ 69.990 e ainda é o mais barato.
Ainda considerando as versões completas, o HB20X é o mais equipado, pois a Diamond Plus oferece como destaque frenagem automática e alerta de mudança de faixa. Ele também tem entrada sem chave e partida por botão, direção elétrica progressiva, volante com ajuste de altura e profundidade, banco do motorista com regulagem em altura, piloto automático, trio elétrico, acendimento automático dos faróis, sensores de estacionamento traseiro, câmera de ré com monitoramento da traseira, sistema multimídia com Android e Apple, airbags laterais, controles eletrônicos de tração e estabilidade e assistente de partida em rampa. O ar condicionado dito como digital tem um porém: não é automático, apenas gráficos digitais no painel, mas é manual. Se não tivesse os recursos de autonomia, eu tiraria o seu primeiro lugar em equipamentos ou o deixaria empatado com o Ka Freestyle, o segundo colocado.
Embora não ofereça o ar condicionado digital e acendimento automático dos faróis, opcionais no Argo, o modelo da Ford tem controles eletrônicos de tração e estabilidade e airbags laterais, que o Trekking não tem. Além disso, tirando a frenagem automática e o alerta de mudança de faixa, o Freestyle tem praticamente todos os itens presentes no HB20X.
O Argo só tem o ar condicionado digital (aliás, o único dos três que oferece o recurso verdadeiro) como opcional no pacote Tech (R$ 3.600), que inclui retrovisores externos com rebatimento elétrico, quadro de instrumentos digital (de série no Hyundai), sensores de chuva e de faróis e retrovisor interno eletrocrômico (que ainda cobra à parte). Outro pacote é o Stile, por R$ 2.990, que traz apoia-braço central no banco do motorista, volante em couro, piloto automático, volante com alavancas de seleção das marchas tipo borboleta, bancos revestidos em couro sintético e banco traseiro bipartido. A câmera de ré (R$ 1.200) fecha a lista de opcionais do modelo da Fiat que tem de série ar condicionado manual, direção elétrica progressiva, sensor de estacionamento traseiro, trio elétrico e sistema multimídia com Android e Apple.
Na assistência, prevalece o número de concessionárias de cada marca e a Fiat é a que tem a maior rede, com 600. Em segundo vem a Ford com 322 e a Hyundai com 211.
Conclusão
3º Ford Ka Freestyle 1.5 AT
Modelo com a carroceria mais antiga do comparativo, o baiano Ford Ka Freestyle só conseguiu o posto de mais barato do trio. Na soma dos pontos, ficou em terceiro lugar. Com um porta-malas pequeno, ruído alto e acabamento simples demais, que o tom marrom não conseguiu disfarçar, o Ford Ka já pede uma nova geração.
Modelo com a carroceria mais antiga do comparativo, o baiano Ford Ka Freestyle só conseguiu o posto de mais barato do trio. Na soma dos pontos, ficou em terceiro lugar. Com um porta-malas pequeno, ruído alto e acabamento simples demais, que o tom marrom não conseguiu disfarçar, o Ford Ka já pede uma nova geração.
2º Fiat Argo Trekking 1.8 Automático
O Fiat Argo Trekking foi o melhor no motor, na assistência e espaço interno, mas divide a vitória com o HB20X no acabamento e no porta-malas. O alto consumo, os freios pouco eficientes e os poucos equipamentos de série revelaram-se os defeitos do hatch mineiro, que era o favorito para ganhar o comparativo.
1º Hyundai HB20X Diamond Plus 1.6 16v
Quem levou foi o HB20X, dominando as provas dinâmicas de desempenho, consumo, frenagem, ruído. Também tem um dos maiores porta-malas e um dos melhores acabamentos do trio. Além disso, possui a carroceria mais moderna e é o melhor equipado (embora engane com um falso ar condicionado digital), com destaque para a frenagem automática, embora seja um dos mais caros junto com o Argo Trekking completo. O espaço interno apertado, a menor (mas já nem tão pequena) rede de concessionárias da Hyundai e o motor fraco são os pontos fracos deste sul-coreano naturalizado brasileiro que acumulou pontos suficientes para vencer o seu segundo comparativo e o segundo da nova geração da linha HB20 no Guscar. Em 2013, a primeira geração do HB20X venceu um duelo contra o pioneiro Volkswagen Crossfox e, no ano passado, o sedã HB20S derrotou o Chevrolet Onix, Fiat Cronos e Volkswagen Virtus. Como deu para notar, os dotes aventureiros dos três modelos ficaram em segundo plano.
TEXTO: GUSTAVO DO CARMO | FOTOS: DIVULGAÇÃO
DADOS DE TESTE: REVISTAS QUATRO RODAS E CARRO (NÍVEL DE RUÍDO)
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