Os moderninhos
Gustavo do Carmo / Fotos: Divulgação / Dados técnicos: Fabricante e Revista Carro

Quando chegaram ao mercado na virada do ano passado para o atual, Ford Ka e Renault Sandero se tornaram os compactos nacionais de baixo custo mais modernos do mercado. Já sabiam que o líder da preferência dos consumidores estava para ser renovado e tiveram seis meses para aproveitar o visual cansado do chefe e superá-lo. O tempo acabou em julho quando, depois de três anos de projeto e muita expectativa, chegou o Novo Gol. Agora, equipados com o motor 1.6 bicombustível, os três se enfrentam neste tão aguardado comparativo.

O Ka é a segunda geração de um modelo lançado mundialmente no final de 1996 e que em apenas quatro meses chegou ao nosso mercado (bons tempos aqueles!) para tentar criar no brasileiro o hábito de comprar carros subcompactos, modernos e baratos. Fez um sucesso razoável. Ganhou admiradores, mas estes o acharam apertado, com traseira esquisita e caro pelo seu tamanho. Por causa disso os subcompactos não pegaram em nosso país que preferiu carros maiores com acabamento bem simples. Para evitar esses erros a Ford espichou o Ka, aumentou seu espaço interno, piorou o acabamento e reestilizou o carro, deixando-o bem diferente do modelo europeu, que continua subcompacto e bem ousado.

O Sandero não é totalmente um compacto de baixo custo. Este papel cabe ao seu irmão sedã Logan. Foi criado para batalhar nas duas frentes: tanto como barato quanto como premium. Usa o mesmo chassi, painel e algumas peças do Logan, mas como o público torceu o nariz para o estilo "ex-soviético dos anos 90" deste a Renault brasileira preferiu desenhar um carro novo e moderno. Não é o sucessor oficial do Clio, mas vai substituindo-o aqui por causa das tendências do nosso mercado. Na Europa, o Sandero é vendido com a marca romena Dacia, que criou o Logan.

Já o Gol dispensa apresentações. A verdadeira terceira geração do modelo que é simplesmente o mais vendido do país há 21 anos surpreendeu e agradou a todos pelo seu design inédito. E a renovação total, que para alguns é apenas a primeira, já está fazendo efeito. O Gol disparou na liderança em seu primeiro mês com a nova carroceria.


A Volkswagen diz que usou referências do Gol de 1980 no desenho da nova geração. Principalmente na traseira. Eu custei pra identificar. Usando a imaginação lembrei mais do modelo 94. Mas o Gol é um carro moderno, embora o perigo dessas referências retrô e a silhueta leve pode ser a desatualização precoce do estilo. Por enquanto, ainda está alinhado com o atual conceito mundial da Volkswagen: faróis, lanternas e pára-choques retos.

Junto com ele se destaca o Sandero com seu visual que divide opiniões. Seus faróis são espichados e arrojados. Mas a grade está fora de moda. Nos Renault europeus o capô é fechado e a entrada de ar é mais acentuada no pára-choque. A maior atração do Sandero é a traseira com as suas belas lanternas e a tampa do porta-malas limpa.

Não estou dando o terceiro lugar para o Ka só porque ele tem duas portas. Mas talvez as outras duas harmonizem o estilo quando chegarem. A exemplo do Sandero, o Ka tem na traseira o seu maior charme. A janela lateral dos passageiros de trás tem recortes arrojados, mas a lateral limpa demais deixa o novo Ka parecido com ar de Volks dos anos 70-80. O visual antiquado piora quando sabemos que os vidros e as portas da frente são os mesmos da antiga geração. Na dianteira mais defasagem: faróis e grade lembram uma mistura do Fiesta de 1999 com o de 2003.

No acabamento o Ka também fica atrás. Apesar da boa montagem dos materiais os plásticos têm aparência pobre e dominam todo o painel. Só não dominam as portas onde se destaca a lataria. O Sandero se preocupou mais com a aparência e ganhou apliques prateados na porta, nas maçanetas, na alavanca do câmbio e nas saídas de ar. O melhor acabamento é o do Gol, que melhorou bastante em relação ao "Geração 4", principalmente na montagem onde a folga entre as peças é mínima. Contudo, o acabamento dos três modelos está aquém do ideal. É preciso melhorar.

Único dos três modelos aqui presente com mais de quatro metros de comprimento (4,02m), o Sandero foi projetado exatamente para ser um carro espaçoso. Pessoalmente, como o Logan, seu tamanho impressiona, apesar de ser menor do que ele. O Sandero ainda tem 2,59m de distância entre-eixos, 1,74m de largura e 1,53m de altura. É o maior dos três. O Gol tem quase 3,90m de comprimento, 2,45m de entre-eixos, 1,65m de largura e 1,46m de altura. O Ka mede respectivamente 3,83m, 2,45m, 1,64m e 1,42m. E o objetivo foi alcançado. Por pouco. Na soma das dimensões internas feitas pela revista Carro, o Renault chegou a 790 pontos. Apenas quatro a mais do que o Gol, que se destacou na folga para as pernas. A boa altura e a largura salvaram os planos do Sandero. Já o espaço interno do Ka ficou na casa dos 700 pontos (760), graças a maior altura. As portas traseiras podem melhorar a sensação na largura e o acesso. Se no espaço interno o Sandero ganhou por pouco, seu porta-malas é insuperável para um carro da sua categoria. Acomoda 320 litros. O Gol manteve o volume da geração anterior nos 265 litros e ficou com o segundo maior bagageiro. O Ka mais uma vez foi prejudicado pelo seu porte e tem apenas 263 litros.


Se parado o Ford Ka fica atrás, é analisando o seu comportamento dinâmico que ele começa a reagir. Seu motor 1.6 Flex é o mais potente e mais forte. Na pista anda mais e gasta menos combustível. O Gol 1.6 vem em segundo lugar, inclusive no torque, tão reforçado que deu nome ao propulsor (VHT - Very High Torque). No desempenho divide o vice com o Sandero, que fora isso ficou atrás no motor e no consumo. Com motor de dezesseis válvulas a história seria diferente, mas desequilibraria o confronto.

Os números: Fiesta 1.6 Flex - potência de 102 cv com gasolina e 110 com álcool; torque de 15,5 kgfm a 2.500 rpm com gasolina e 15,8 kgfm a 4.250 rpm com álcool; aceleração de 0 a 100 km/h em 11,5 segundos; retomada de 80 a 120 km/h em 11,7 segundos; velocidade máxima de 178 km/h; consumo de 8,4 km/litro na cidade e 13,9 km/l na estrada. Gol 1.6 VHT TotalFlex - potência de 101 cv com gasolina e 104 cv com álcool; torque de 15,4 kgfm a 2.500 rpm com gasolina e 15,6 kgfm a 2.500 rpm com álcool; aceleração de 0 a 100 km/h em 12,4 segundos; retomada de 80 a 120 km/h em 12,9 segundos; velocidade máxima de 192 km/h, consumo de 8,8 km/l na cidade e 12,4 km/l na estrada. Sandero 1.6 8v Hi-Flex - potência de 92 cv com gasolina ee 95 cv com álcool; torque de 13,7 kgfm a 2.850 rpm com gasolina e 14,1 kgfm a 2.850 rpm com álcool; aceleração de 0 a 100 km/h em 12,4 segundos; retomada de 80 a 120 km/h em 12,9 segundos; velocidade máxima de 192 km/h, consumo de 8,8 km/l na cidade e 12,4 km/l na estrada. Potência e torque foram fornecidos pela fábrica. Números de desempenho e consumo foram medidos pela revista Carro.

A mesma publicação testou o Gol com freios ABS, um opcional importante, mas que encarece o carro. Por isso, obteve o melhor resultado de frenagem: 40,2 metros vindo a 100 km/h. O Ka ficou em segundo com 56,1 e o Sandero com 58,1m. O nível de ruído também medido é quase efeito do acabamento. O Gol ficou em primeiro com 69,2 decibéis a 120 km/h. Mas Fiesta e Sandero empataram em segundo lugar na faixa de 72 dB.

Na configuração básica o Gol é o mais barato e somaria mais uma vitória no preço. Custa R$ 32.290, quinhentos reais mais barato do que o Ka. O Sandero custa R$ 35.990. Só que a vitória não é do Gol e sim do Ka. O preço básico não inclui os equipamentos "obrigatórios" do brasileiro: pintura metálica, ar condicionado, direção hidráulica, vidros e travas elétricos, talvez os retrovisores, também formando o trio. Aliás, quase não inclui, porque o Ka tem trava elétrica de série. E ainda oferece de graça travamento automático em movimento, alarme e destravamento do porta-malas, tudo por controle remoto. Por isso o comprador economiza e só paga R$ 34.976. É o melhor custo-benefício. Por R$ 39.560 o Gol fica em segundo lugar com a configuração média, sem a necessidade da versão Power, mas com o kit Trend. Na lista de opcionais, destaque para os freios ABS e o computador de bordo i-System, que dá um visual moderno ao quadro de instrumentos. Mas peca por cobrar à parte itens que a maioria dos carros populares básicos traaz como os bancos traseiros bipartidos e o desembaçador/limpador lavador traseiro. Em compensação traz de série banco do motorista com regulagem de altura, cintos de segurança dianteiro com ajuste de altura e apoio de cabeça traseiro. O Sandero sai por R$ 41.070 semi-completo. Só falta o airbag, que adiciona mais R$ 1.550. É o mais caro, mas fica em segundo lugar no nível de equipamentos por trazer um pouco mais de itens como preparação para som e o desembaçador/limpador de série.

CONCLUSÃO

O Gol parecia que ia dominar este comparativo ao ser um dos mais bonitos (o outro é o Sandero) e o de melhor qualidade no acabamento. Com o melhor espaço interno e porta-malas o Renault parecia ser o maior rival e a briga talvez ficasse restrita aos dois. Parecia, porque o Ka pode ser esquisitinho, franciscano e apertadinho, mas anda mais do que os rivais graças ao seu motor mais forte. E ainda é econômico. Tanto no combustível quanto no preço. Ficou em segundo depois de quase impedir a vitória do Gol, mas este a garantiu com conforto e segurança. O Sandero que era favorito ao vice ainda ficou atrás do Ka por apenas dois pontos. Mas não ficou muito longe do Volks: a apenas quatro. No comparativo entre os compactos mais modernos, Ka e Sandero deram trabalho ao líder, mas no mercado precisarão de muito tempo para tomar o seu posto.