Há 25 anos, com a chegada do Tempra ao mercado, começava a tentativa da Fiat de emplacar um carro grande com o seu nome no Brasil. Em seus primeiros anos em nosso país, a marca italiana participava do mercado de luxo através da Alfa Romeo, cuja filial brasileira foi comprada pela então rival italiana, que só em 1986 a adquiriu mundialmente.


Alfa Romeo 2300 - o representante da Fiat no mercado de luxo

Até 1992, carro com o emblema Fiat na grade e na tampa do porta-malas, só compactos, como o 147, o Oggi, a Panorama, Uno, Prêmio, Elba e seus respectivos furgões e picapes. Ao encerrar a produção do Alfa Romeo 2300 ti em 1986, aí sim, a Fiat ficou ausente do segmento de carros grandes.

Em fevereiro de 1990, surgia na Itália um belo sedã de teto alto, caída arredondada para traseira curta e alta, construído sobre o chassi de um hatch médio, porte que a Fiat também ainda não produzia por aqui (o que ocorreria seis anos depois), o Tipo. Lançado em 1988, era um projeto que daria continuidade ao conceito do Uno. Tanto que quase foi chamado de Duo (dois, em italiano). Seu sedã seria o Tre. Com o nome definitivo do hatch, a versão de três volumes se chamaria Tipo Tre. Mas o departamento de marketing da Fiat precisou trabalhar mais a cabeça para criar um nome de fonética parecida, mas querendo demonstrar uma proposta. Assim nasceu o Tempra, nome que significa temperamento em italiano.



O Tempra não era o topo-de-linha da Fiat na Itália. Este papel era desempenhado pelo Croma (cuja geração seguinte, exclusivamente uma perua, fez muito sucesso no Salão de São Paulo de 2006, mas acabou não vindo). Com os seus 4,35m de comprimento, 1,69 de largura e 2,54m de distância entre-eixos (as duas últimas medidas, iguais ao do Tipo), coeficiente aerodinâmico de 0,28 Cx, um porta-malas para 500 litros, amplo espaço interno e acabamento luxuoso, a filial brasileira viu nele uma ótima oportunidade de produzir, pela primeira vez, no país um Fiat grande em nosso país.


Mas o projeto do Tempra precisou ser adaptado para se ajustar à realidade econômica brasileira. Saíram o painel digital de dois andares, o ar-condicionado eletrônico, os freios ABS, o limpador do vidro traseiro e o coeficiente aerodinâmico foi aumentado para 0,32 Cx. Outras adaptações foram feitas na coluna das portas (escuras na Itália e na cor da carroceria aqui), na tampa do porta-malas - com a maçaneta passando para cima da placa (no italiano ficava em baixo) e na carcaça dos retrovisores externos, que tinha uma fixação vazada.


O painel instalado no modelo brasileiro foi mais simples - com console convencional e quadro com instrumentos analógicos. O acabamento idem. Mesmo assim, o Tempra brasileiro ganhou equipamentos nunca antes vistos num Fiat daqui (embora o Alfa Romeo 2300 já tivesse) como ajuste de altura do volante e do banco do motorista, retrovisores elétricos, travamento elétrico das portas com interruptor no painel, rádio toca-fitas e detalhes imitando madeira. Por fora, capô que escondia um pouco o limpador de pára-brisas e vidros rentes à carroceria eram detalhes que fizeram do Tempra um objeto de desejo dos donos dos carros compactos da marca italiana. Além de tudo, a capacidade do porta-malas do modelo brasileiro aumentou para 552 litros.



O Tempra brasileiro foi apresentado em novembro de 1991, mas as vendas só começaram no final de janeiro de 1992. Para aguçar a curiosidade do público na televisão, o teaser foi feito com anúncios estrangeiros do Tempra, mostrando que ele também foi muito aguardado na Europa. Finalmente, chegou ao mercado nas versões de acabamento Prata e Ouro e motor 2.0 transversal. A identificação visual das versões era feita pelo tom da plaqueta da assinatura Tempra. Prateado no Prata e dourado no Ouro, que, internamente, se diferenciava pelo apoio do braço entre os bancos dianteiros além dos apliques de madeira imitada. Na televisão, a trilha sonora da campanha definitiva de lançamento era Night and Day, cantada por Frank Sinatra na abertura do comercial e pelo U2 quando era apresentado o Tempra.


A suspenão traseira era a mesma dos modelos superiores como o Croma, Lancia Thema e Alfa Romeo 164, sendo que apenas o último foi importado para cá. Só não usava o subchassi na dianteira. O motor pecava por ser muito antigo, apesar da cilindrada inédita para um Fiat, que parava nos 1.6. Era emprestado pelo Regatta fabricado na Argentina e não tinha injeção eletrônica. Somente meses depois ganhou um catalisador, para cumprir a lei de emissões de poluentes adotada a partir daquele ano de 1992. Tinha 99 cavalos de potência e 16,4 kgfm de torque. O câmbio também era de mecânica mais simples, mas foi suficiente para começar a tirar a fama da caixa de marchas dos Fiats pequenos. Tinha relação mais longa e engates precisos, suaves e silenciosos, sem arranhões.

Com o Tempra já acomodado no mercado brasileiro, surgiram as primeiras novidades. Para começar, uma versão que os europeus nunca viram: um cupê de duas portas. No ano seguinte, a injeção eletrônica finalmente foi adotada no Tempra para marcar a estreia do cabeçote de dezesseis válvulas em um carro brasileiro. O seu batismo publicitário foi ser carro-madrinha do Grande Prêmio do Brasil de Fórmula 1, vencido por Ayrton Senna, que desfilou após a bandeirada dentro do carro, acenando para o público pela janela. Depois daquela tarde um brasileiro só venceria em casa com Felipe Massa em 2006 e 2008.


Voltando ao Tempra, o motor tinha a moderna injeção eletrônica multipoint e 127 cavalos. A grade sofria uma leve modificação, perdendo a assinatura FIAT no canto, ficando apenas as barras diagonais no centro, e ganhando quinas arredondadas. Como era mais luxuoso e tinha até bancos em couro como opcional, a plaqueta era dourada e as rodas de liga-leve, cromadas (que hoje seriam chamadas de diamantadas). Finalmente ganhava freios ABS e bancos com regulagem elétrica.


Em abril de 1994, a Fiat surpreendia com a linha 95, com o ano corrente mal começado, inaugurando um desleal hábito que seria seguido por várias montadoras até hoje. Para desgosto dos proprietários que compraram o carro no início do ano, o Tempra veio com as cinco barras diagonais pequenas e coladas diretamente na grade escura, além do painel com desenho mais moderno, arredondado, com computador de bordo.



O grande destaque da linha, entretanto, era a versão Turbo i.e., oferecida apenas no modelo de duas portas. Tinha aerofólio traseiro e rodas de liga-leve "diamantadas". O motor era oito válvulas e tinha 165 cavalos (a mesma potência do 3.0 do rival Omega), levando o Tempra para os 220 km/h e acelerando de 0 a 100 km/h em cerca de oito segundos. Outro equipamento que o Tempra europeu já tinha desde 1990 e que chegava ao Brasil com o Turbo era o ar condicionado digital.


No meio do ano, o modelo básico deixava de ser chamado de Prata para ganhar injeção eletrônica single-point - com apenas um bico injetor - e passar a ser identificado como i.e. A potência aumentava dos 99 para 105 cv. Também havia o motor a álcool. O ótimo ano de 1994 para o Brasil (não só pela conquista do tetra, como também pelo fim da inflação e intensificação das importações) reservava mais duas novidades para o Tempra. Com a redução da alíquota de importação de 35% para 20% pelo então Ministro da Fazenda Ciro Gomes, a Fiat animou-se para importar a versão perua, chamada SW, existente no exterior desde 1990.




Não era tão bonita como o sedã, mas atraía olhares do mesmo jeito. Era mais reta, quadrada e conservadora. Como vinha quase fresca da Itália, trouxe a suspensão e o painel digital original do Tempra europeu. Até a sua grade era diferente da usada no sedã brasileiro. Já vinha do face-lift europeu, mas lembrava a anterior, só que sem o friso central. Os retrovisores externos também não tinham a fixação vazada. Em compensação, o espaço para o porta-malas era ótimo. Como alegria de brasileiro dura pouco, o modelo importado não tinha os sete lugares oferecidos na Itália e motor 2.0 multipoint perdeu potência, caindo de 115 cv para 109 cv, por causa da "ótima" gasolina brasileira.

No início de 1995, o motor turbo chegou ao modelo de quatro portas. Como cada versão de carroceria tinha um público diferente, o toque esportivo foi substituído por uma imagem mais luxuosa. Por isso, o nome mudou para Tempra Stile. O visual deste era mais sóbrio, não havia aerofólio e as rodas eram mais discretas. Para completar o aspecto sofisticado ganhou um novo console, persianas no vidro traseiro e opção de couro bege. Conviveram no mercado por algum tempo, mas o Turbo Coupé logo saiu de linha, junto com todas as versões de duas portas. O coupé teve um sucesso razoável.


Para a linha 1996, os faróis ganharam refletores duplos e ficaram mais estreitos. Uma alteração semelhante a que ocorreu no Alfa Romeo 164. Em 1997, as versões foram reorganizadas para SX (oito e dezesseis válvulas), HLX 16V e Stile Turbo. O Tempra começava a ganhar simplificações. Já acusava o peso da idade. O seu sucessor, o Marea, já estava em testes para substituí-lo no Brasil, como aconteceu na Europa. A perua SW, que já passara a vir da Turquia porque na Itália o Tempra não existia mais, deixou de ser importada definitivamente.


Ainda assim, em 1998, deu tempo para a Fiat fazer uma leve alteração cosmética no Tempra, mudando a grade, os pára-choques, colunas e maçanetas laterais. Mudou novamente a nomenclatura das versões, limitando-se a chamar de 8V e 16V. Acabava com a versão turbinada Stile. Em junho chegava o Marea, junto com a sua perua Weekend (primeiro importada da Itália). Em novembro daquele ano, terminava a história do primeiro carro grande com a marca Fiat fabricado no Brasil.


O Tempra fez até sucesso. Vendeu 18.015 unidades em seu primeiro ano de mercado, tendo o ápice de 41.227 em 1994. Mas seus sucessores não foram muito felizes. Depois de encerrar a produção do Marea em 2007, a Fiat fez uma terceira tentativa no segmento de sedãs médios em 2008, com o Linea, que usava a plataforma alongada do hatch compacto Punto. Também não deu certo.



Desde o ano passado, quando o Linea teve a sua produção encerrada, a marca italiana está sem um sedã grande em sua linha. Há especulações sobre a vinda do Tipo sedã, mas a Fiat desmente. Já foi especulado o sedã Viaggio, que acabou não vindo. A volta da Alfa Romeo também é sempre cogitada, mas também esquecida. Já a Chrysler está praticamente sem sedãs. Depois de três tentativas malsucedidas, a Fiat está com medo de se arriscar no segmento. O Tempra ficou só na lembrança.

TEXTO: GUSTAVO DO CARMO | FOTOS: DIVULGAÇÃO
FONTE DE CONSULTA: BEST CARS WEBSITE