O segmento de hatches médios tem sido bastante desvalorizado no Brasil há muito tempo. A Citroën abandonou o segmento em 2014, quando parou de importar o C4 de primeira geração e sequer trouxe a segunda. Mesma coisa com a Nissan com o Tiida um ano antes. A Peugeot ainda vende o velho 308 com uma gambiarra estética. Honda e Toyota nunca trouxeram as versões hatch de Civic e Corolla, respectivamente. A Renault só vendeu a primeira geração do Mégane do gênero de 1998 até 2005. A Fiat acabou de encerrar a produção do Bravo. A Hyundai já está com o i30 desatualizado e não sinaliza que vai trazer a nova geração. Já os produtos das marcas premium, como Audi (A3 Sportback), BMW (Série 1), Mercedes (Classe A) e Volvo (V40) estão em outra faixa de preço.

Mas de vez em quando surge uma boa novidade, como a segunda geração do Chevrolet Cruze Sport6, que segue as linhas arredondadas do sedã que lhe deu origem, traz os mesmos equipamentos de tecnologia e também passa a vir da Argentina.

Claro que eu considerei a versão completa LTZ, com opcionais, para enfrentar o Volkswagen Golf Highline (que também tem motor flex 1.4 turbo e injeção direta como o Cruze) e o Ford Focus Titanium Plus, que também é flex, tem injeção direta, mas não tem turbo e é 2.0. Com tão poucas opções em sintonia com o mercado externo (regra para participar dos comparativos do Guscar, exceto modelos queridos no Brasil), mais uma vez um comparativo de hatchs médios tem apenas três participantes.


Estilo e Acabamento


Apesar de eu já ter criticado a falta de originalidade no estilo do Cruze Sport6, ele é claramente o mais moderno dos três modelos aqui analisados pelas suas linhas arredondadas. A vitória poderia até ir para o Focus. que, com seis anos de idade na Europa (só chegou aqui em 2013), ainda mantém uma certa jovialidade, mas já apresenta algumas "rugas" no projeto, mexido em 2014 (2015 aqui). E já vai mudar ano que vem em seu continente de origem. Melhor deixá-lo com o segundo lugar. Já o Golf paga o preço pelo seu estilo conservador que, mesmo sendo dois anos mais novo (aqui no Brasil os dois foram lançados no mesmo ano) que o modelo da Ford, parece já ter mais de dez anos. Na Europa, ele já passou por um face-lift.


O Golf também é conservador no interior, mas é o que tem o melhor acabamento, com materiais emborrachados na maior parte do painel e nas portas. O Focus tem painel emborrachado, mas plástico duro nas portas. Já o Cruze tem couro em apenas algumas partes do painel e o restante é dominado pela dureza dos revestimentos.



Espaço interno e Porta-malas


Com 2,70m de distância entre-eixos, o Cruze oferece mais espaço para as pernas no banco traseiro seguido pelo Focus, que tem 2,65m. Já o Golf tem 2,63m e é o mais apertado. Em compensação é o único com saída de ar condicionado para quem vai atrás.

O novo modelo da Chevrolet também tem o maior porta-malas: 408 litros. Golf e Focus têm praticamente o mesmo volume, com vantagem de três litros para o Ford (316 a 313).


Motor e Câmbio

Motor 1.4 Turbo ECOTEC do Cruze Sport6

A segunda geração do Cruze hatch trocou o velho motor 1.8 pelo moderno 1.4 Turbo Flex com injeção direta, mas manteve o nome ECOTEC. O câmbio permanece o automático de seis marchas da carroceria anterior. É exatamente o mesmo esquema mecânico do Golf, que tinha câmbio automatizado de dupla embreagem e sete marchas nas unidades importadas da Alemanha e do México. Mas o trocou pelo Tiptronic de seis velocidades. Os dois têm potência parecida, com três cavalos a mais com álcool no Cruze (153 a 150 cv). Com gasolina são os mesmos 150 cv para os dois modelos. Que perdem para os 178 e 175 cv do Focus, que é 2.0 e só tem injeção direta. Sua transmissão é automatizada de dupla embreagem e seis velocidades, que já começa a ficar antiquada (aqui, uma mudança de opinião em relação ao comparativo anterior).


Desempenho e Consumo

Motor 2.0 DirectFlex do Focus

Pena que a potência superior do motor do Focus não se traduziu em números igualmente melhores. O Ford foi o mais lento e gasta mais combustível. E olha que estão dizendo que as cilindradas superiores voltarão a ser usadas para melhorarem as emissões.

Segundo a revista Quatro Rodas, os três modelos obtiveram números muito próximos de retomada entre 80 e 120 km/h. O Cruze fez em 6,5 segundos, o Golf em 6,7 s e o Focus em 6,8 s. Mas a maior diferença, determinante para a vitória do hatch da Chevrolet foi na aceleração de 0 a 100 km/h. O Cruze ficou com 8,8 segundos, o Golf com 9,5s e o Focus cumpriu a marca em 10,3 s.

Motor 1.4 TSI do Golf

No consumo de gasolina a vitória um empate técnico entre Golf e Cruze, com soma dos percursos de 28,2 km/l (12,3 km/l na cidade e 15,9 km/l na estrada) para o primeiro e 27.8 km/l (12 e 15,8 km/l). Atrás, ficou o Focus com 25,7 km/l (10,6 e 15,1 km/l).


Frenagem e Nível de Ruído

Os freios do Golf se mostraram mais eficientes no teste da Quatro Rodas, fazendo-o parar em 62,3 metros após o pedal ter sido acionado a 120 km/h. Chevrolet Cruze e Ford Focus tiveram um empate técnico, com o Chevrolet parando em 65 metros e o Ford em 65,6 m.

Na medição de ruído a 80 km/h, também houve empate, mas no primeiro lugar. Mais uma vez entre Cruze (60,2 decibéis) e Golf (60,6 dBA). E novamente o Focus ficou em terceiro, com 63,3 decibéis.


Preço, Equipamentos e Assistência


O Focus tem o melhor custo-benefício dos três hatches médios aqui comparados. Considerando a versão top Titanium Plus, que não tem opcionais, ele custa R$ 111.400 (até o fechamento deste texto). Este preço já inclui a pintura branca, que custa R$ 500. Outras opções de cores, como a vistosa Azul Aurora e a Preto Gales estão por R$ 1.300. A única pintura sem custo é a Vermelho Bari.

De série ela vem com borboletas de mudanças de marcha no volante, rodas de liga-leve de 17 polegadas, controles eletrônicos de estabilidade e tração, assistente de partida em rampas, controle de torque em curva, aviso da pressão dos pneus, seis airbags (frontais, laterais e cortina), terceira geração do sistema multimídia Sync com tela de 8 polegadas que inclui navegador, câmera de ré e assistência de emergência, entrada e partida sem chave, faróis de neblina, sensores de faróis e chuva, ar condicionado digital de duas zonas, bancos revestidos em couro, banco do motorista com ajuste elétrico, sensores de estacionamento dianteiro e traseiro, piloto automático, assistente de frenagem autônomo, sistema de estacionamento automático, espelhos retrovisores externos com rebatimento elétrico, teto solar, alarme e luzes diurnas em LED.


O Cruze na versão LTZ básica custa R$ 103.290 e da lista do Focus não tem borboletas no volante, faróis de xenônio e controle de torque em curva, mas tem partida do motor por controle remoto e aquecimento dos retrovisores externos. No entanto, boa parte dos itens do rival, como banco do motorista elétrico, sistema de estacionamento automático e piloto automático estão no pacote opcional que leva o preço para R$ 113.090. Em compensação, também inclui assistência de permanência na faixa de rolamento, aviso de ponto cego, indicador de distância para o veículo da frente e carregador magnético. Alguns itens são semelhantes, mas de funcionamento diferente como assistentes de emergência e frenagem no Ford e sistema OnStar, alerta de colisão e faróis auto-adaptativos no Cruze. A cor branca sólida custa R$ 650, as metálicas R$ 1.500 e a Branco Abalone, única perolizada, R$ 1.550. Mas não chega ao abuso cometido pela Volkswagen. 


O Golf também tem de série na versão Highline ar condicionado digital de duas zonas, borboletas no volante, controles de estabilidade e tração, espelhos retrovisores aquecíveis, sensores de estacionamento dianteiros e traseiros, alerta de pressão de pneus, piloto automático, direção com assistência elétrica, bancos em couro e sensores crepuscular e de chuva. Custa R$ 107.600 (preço entre o Cruze e o Focus). Tem alguns diferenciais ausentes nos dois concorrentes como airbag para o joelho do motorista, bloqueio do diferencial, sistema start-stop e frenagem com regeneração de energia. Mas as rodas de liga-leve de 17 polegadas (as de série são de 16"). o piloto automático adaptativo, sistema de estacionamento  automático, câmera de ré, navegador, faróis bixenônio e banco do motorista com regulagem elétrica, juntos, estão no pacote opcional mais caro, o Premium, que tem os diferenciais do detector de fadiga e seletor de modo de direção e custa mais de 28 mil reais e leva o preço para R$ 136.432. Com o teto solar panorâmico, o Golf Highline já chega a R$ 141.006. Isso sem a pintura metálica, que custa R$ 1.423, ou a única perolizada oferecida, a Preto Mystic, por R$ 1.524. Custo-benefício, há muito tempo, já não é uma virtude da Volkswagen. 

A crise econômica foi fortemente sentida na indústria automobilística (setor que mais registra inflação) e, com isso, os consumidores fugiram e as concessionárias fecharam. A Volkswagen foi a mais afetada. Já teve mais de 700 revendas e agora só tem exatas 600, passando a dividir, pela primeira vez, o primeiro lugar com a Chevrolet e a Fiat (que, com o fim do Bravo, não está aqui no comparativo). A Ford continua atrás com 399. Os três possuem três anos de garantia. 


Conclusão 

 Apesar do melhor custo-benefício (preço e equipamentos foram as suas únicas vitórias), o Ford Focus ficou em terceiro lugar no comparativo por causa do motor 2.0 que, mesmo com a maior potência, sentiu o peso do volume cúbico mais elevado e o deixou para trás em desempenho. Ele também gasta mais combustível e é o mais ruidoso, segundo a revista Quatro Rodas. O câmbio automatizado também não ajudou. A rede de concessionárias também foi reduzida. 

Logo que a atual geração do Golf foi lançada, em 2013, ainda importada da Alemanha, fiz um comparativo e o 1.4 Highline passeou contra o Focus 1.6, o Bravo e o antigo Cruze. Na análise do ano passado, o modelo já nacionalizado ganhou do Focus no critério de desempate (maior número de vitórias). Agora, o Volkswagen perde a invencibilidade. Os melhores equipamentos condicionados a um caro pacote de opcionais, que fizeram o Golf invadir a faixa de preço dos modelos premium, longe dos seus reais concorrentes e do bolso do consumidor, já existiam em 2013. O motor 1.4 turbo ganhou potência (passou de 140 para 150 cv), mas ficou atrás do Cruze, que também evoluiu em desempenho, estilo e espaço interno. O melhor acabamento, a melhor frenagem, uma das maiores redes de concessionárias, um dos melhores câmbios, consumo e ruído interno, além do desempenho superior ao Focus, ainda fazem do Golf um bom carro, mas essas pontuações máximas não impediram o troco do Chevrolet Cruze por sete pontos de diferença (a geração anterior do Chevrolet havia ficado em segundo no comparativo de 2013, com oito pontos a menos). 

Ninguém imaginaria que a segunda geração do Chevrolet Cruze pudesse evoluir tanto. Acabei surpreendido pela sua modernidade e o seu custo-benefício (ainda que tenha perdido para o Focus). Seu motor 1.4 turbo também é mais fraco que o Ford, mas conseguiu ser três cavalos mais potente que o Golf. E ainda foi o mais rápido. Também se destacou no porta-malas e no espaço interno. Mas teve que dividir com o Golf os méritos no câmbio, consumo, ruído e assistência. A melhor lista de equipamentos dividiu com o Focus. Seu único deslize foi no acabamento mais rústico, disfarçado por alguns pedaços de couro no painel. Só neste item o Cruze Sport6 fez sentir saudades do Astra, da Opel, que agora pertence à Peugeot-Citroën. A conferir o desempenho do Cruze sedã nos próximos comparativos porque o hatch foi aprovado. 


Publicado originalmente em 14 de março de 2017
TEXTO: GUSTAVO DO CARMO | FOTOS: DIVULGAÇÃO
DADOS DE TESTE: REVISTA QUATRO RODAS


1º Chevrolet Cruze Sport6 LTZ 1.4 Turbo 



2º Volkswagen Golf Highline 1.4 TSI



3º Ford Focus Titanium Plus 2.0